Somos o que comemos (formato entrevista)

 

P: “Somos o que comemos” é muito parecido com aquela célebre frase de Hipócrates, o pai da medicina, “que o teu alimento seja o teu remédio e que o teu remédio seja o teu alimento”. Porque é que escolheste este tema, Ricardo?

R: Bom, a verdade é que sou amiúde solicitado para participar em congressos e seminários sempre com o tema da alimentação. Também não é para menos… Antes de tirar a pós-graduação em Terapias Naturais e Complementares, implementei o meu próprio espaço, em Famalicão, que era uma loja que vendia alimentos biológicos, mas também tinha uma área de restauração, onde, durante anos, trabalhei como cozinheiro, preparando e servindo pratos vegetarianos e biológicos aos clientes. Curiosamente, uma das frases que coloquei na parede da cozinha era precisamente esta de Hipócrates que evocaste. E é verdade o que ela diz: quando surge um determinado problema de saúde, em primeira instância, devemos procurar efetuar um determinado número de correções alimentares e só depois, se não surtir efeito, é que devemos recorrer ao químico, à medicação alopática. E mesmo depois de haver um tratamento pela medicina convencional, um cancro, por exemplo, depois de efetuar o protocolo de quimio e até radioterapia, devem as pessoas procurar uma via alternativa ao que faziam anteriormente e que, muito provavelmente, estava errado. No caso do cancro, por exemplo, devemos enveredar por uma dieta o mais anti-inflamatória possível. O que isto quer dizer? Recorrendo a uma alimentação mais rica em antioxidantes e com cofatores dos antioxidantes que já existem no nosso corpo, como por exemplo várias vitaminas e oligoelementos, como o selénio. Para dar um exemplo (costumo dar este exemplo muitas vezes): Muitas vezes as pessoas sofrem de um cansaço inexplicável, dificuldade em perder peso, formigueiros nas extremidades, cabelos e unhas fracos. Vão ao médico de família e ele manda passar as habituais análises de rotina, incluindo os marcadores hormonais para a função da tiroide — o T3, o T4 livre e o TSH. E quando os resultados chegam normais a suspeita parou por ali. Só que por vezes a tiroide está mesmo em hipofunção e estes valores estão dentro da normalidade porque estamos sempre a falar, em termos estatísticos, de um intervalo muito lato. Sem comprometer a decisão médica de ter parado por ali a suspeita de falta de rendimento da tiroide, as pessoas podem começar, por sua iniciativa, a comer duas castanhas do Pará, do Brasil e introduzir, de vez em quando, uma alga kombu ou wakame, por causa do Iodo. Por vezes, em semanas, o cansaço desaparece e os cabelos e as unhas ficam mais fortes. Mas, repara, são só umas dicas. Sempre que há cansaço inexplicável o clínico deve averiguar a fundo o que se passa. Pode ser por exemplo uma anemia e isso deve ser estudado a fundo. Só que, em bom rigor, qualquer problema de saúde continua a ser tratado de uma forma clássica. Do meu ponto de vista deveria haver uma maior abertura para entender o que as melhores dietas do mundo podem aportar para corrigir os desvios que o levaram a ficar doentes em primeira instância. Há de haver sempre alguma coisa que sabemos que estamos a fazer errado e podemos corrigir.

P: Então, o que estás a dizer é que há uma fissura entre a visão clássica da alimentação e a visão da nutrição integrativa ou até da ortomolecular, correto?

R: Sem dúvida. O mundo que envolve a saúde é feito de castelinhos. A nutrição não é exceção. Como já referi já fui muitas vezes convidado para falar da alimentação em congressos e na mesa de palestrantes estavam distintos nutricionistas. A maioria não queria, nem ao de leve, por exemplo, considerar a hipótese de que o leite de vaca poder não ser assim um tão bom alimento para os humanos. Quando uma criança desenvolve otites e amigdalites de repetição, alergias respiratórias, tenho quase uma taxa de 70 a 80% de recuperação quando sugiro experimentar tirar o leite durante algumas semanas. Repara: nenhum aluno acabadinho de sair das fileiras da faculdade de nutrição, fresquinho no mercado de trabalho, depois de anos de indoutrinação, contesta a evocação dos malefícios da caseína do leite de vaca ou das hormonas de crescimento da vaca, que por mimetismo atuam também nos recetores humanos, conduzindo a desequilíbrios. A visão da nutrição integrativa e até da ortomolecular é que é possível curar ou, no mínimo, mitigar uma miríade de patologias por suaves, mas, contudo, incisivas correções alimentares. E às vezes é algo tão simples como eliminar o leite ou o glúten. Sobretudo, considero que estamos a chegar a um ponto em que todos deveriam ouvir a outra parte, em respeito mútuo, para levar a cabo uma transformação séria do modelo de saúde.

P: Vou perguntar-te diretamente, até porque é o que as pessoas que estão a assistir pretendem ouvir: Qual é de facto a melhor dieta para nós, para os humanos?

R: Essa pergunta tem rasteira, eh, eh. Tu sabes que existem muitas dietas no mundo. Umas são boas e outras são excelentes, como a dieta mediterrânea. Só que entrou facilmente no jargão popular dizer que temos uma dieta excelente e por isso temos uma espécie de escudo protetor. Eu lembro a essas pessoas que a dieta dos portugueses contemporânea é tudo menos mediterrânea, que deveria conter o licopeno do tomate, os ácidos gordos polinsaturados contidos no azeite extra virgem de primeira pressão a frio, o resveratrol — potente antioxidante contido nas uvas, portanto, no vinho —, etc. A dieta hoje em dia é muito diferente. Existem muitas outras que também são muito boas: a dieta de Okinawa, a dieta do Paleolítico, para não falar de outras. Se queres mesmo saber, acredito que um misto entre a dieta do paleolítico — a Paleo — e a de Okinawa será muito próximo do ideal, porque é anti-inflamatória, rica em antioxidantes e ácidos gordos polinsaturados, probiótica e baixa em calorias. No fundo eu acredito que é sempre mais fácil percebermos o que nos faz mal do que o que nos faz bem. Por isso um bom começo é remover o que nos faz mal — o açúcar, os alimentos processados, os fritos, onde se formam aminas e outros compostos tóxicos e até carcinogénicos, como a acroleína e a acrilamida. Depois há um alimento que é muito importante e muita pouca gente lhe dá o merecido destaque — a água. O corpo humano é composto por dois terços de água, sendo que em apenas dias essa água é renovada, ou seja, em apenas dias dois terços de nós não estava cá, mas noutro local, eh, eh. A água é fundamental no processo de limpeza e de remoção de toxinas, por isso a água deve ser pura, portanto, isenta de substâncias adicionadas e o mais energética possível. Houve um cientista japonês — Masuro Emoto, que se dedicou a estudar os cristais de água e percebeu que uma água energeticamente morta, produzia cristais de gelo pouco harmónicos, disformes e uma água da nascente, energizada, cristais lindíssimos, harmónicos e vibrantes. Respondendo à tua questão diretamente, eu diria que há antinutrientes que deviam ser evitados ao máximo, como os antinutrientes das leguminosas, as solaninas das solanácias que são a batata, o pimento, a beringela e o tomate verde, o leite e o glúten já são um bom começo… Mas não é só a dieta que é importante. Devemos também pensar no modo de confeção e também nos instrumentos que utilizamos. Eu, por exemplo, utilizo a cozedura a vapor e uso uma air-fryer, que não utiliza qualquer gordura. Também quando utilizamos crus, como a alface, os tomates e as frutas devemos procurar descontaminar. Não o descontaminar de microrganismos, porque isso já é feito a jusante, pelos técnicos das águas, adicionando-lhe cloro e outras substâncias, mas o descontaminar de fitoquímicos e xenobióticos que são utilizados pela agricultura em massa para tratar as pragas de forma química. Ao ingerirmos uma fruta ou legume estamos a trazer para dentro do corpo inúmeras substâncias que nos prejudicam. Eu tenho uma dica, porque tive a preocupação de ler várias publicações científicas sobre o assunto: sugiro numa taça de água colocar duas colheres de chá de bicarbonato de sódio e deixar as frutas e legumes 15 minutos a descontaminar.

P: Ó, Ricardo, então eu tenho mesmo de te perguntar…: Tu tens uma família, três filhos… o que lhes dás de comer?

R: Pois é, “em casa de ferreiro, espeto de pau”. Dou muitas aulas em escolas de referência no âmbito da nutrição integrativa e falo de dieta paleolítica, proteínas vegetais, alimentação crudívora, sumos e detox, superalimentos e probióticos. Nessas alturas, como tenho de preparar as aulas, durante a semana que antecede e na semana subsequente, comemos muito bem, de acordo com os preceitos que preconizo, pois tenho de preparar os pratos para as aulas. De resto, nos outros dias em que não tenho aulas, admito que cometo alguns excessos e como algumas coisas que sei que não fazem lá muito bem, como uma tablete de chocolate. Mas, espera, isso, às vezes não é assim tão mau como parece, sabes porquê? Porque a alimentação não deve ser restritiva e muito menos repressiva. Já se sabe: “quanto maior a repressão, maior a perversão”. O que isto quer dizer? Que todos temos direito a ter uma recompensa, ou seja, se nos apetece um quadradinho de chocolate, não devemos fazer o esforço de reprimir esse desejo. A parte psicológica da alimentação é muito importante. E, mesmo que em dietas de restrição calórica se passem muitas privações para ter um corpo mais adequado aos padrões da sociedade atual, mal a parte psicológica fique afetada retorna-se aos erros e com maior força, daí as chamadas dietas ioió, por causa das recaídas. Se durante os períodos em que estamos a fazer mais restrições dermos alguns miminhos, esses “desejos” desvanecem. É por isso que não gosto quando me consultam para emagrecer. Emagrecer surge naturalmente quando adequamos a nossa alimentação à nossa condição humana, ingerindo nutrientes com qualidade, mas também satisfazendo a parte psíquica, que é muito importante. Em casa, tento cozinhar da forma mais pura e saudável possível, mas permito a utilização ocasional de derivados de leite, como iogurtes, chocolate para ficarmos mais bem-dispostos, etc.

P: Eu sei que és um pouco malandro… quando escolheste o tema “Somos o que comemos” não estavas só a referir-te à comida, pois não?

R: Eh, eh, já me conheces muito bem... Sim, claro que não é só pelos alimentos que “comemos” coisas. O homem é um animal social, necessita de interação e também se alimenta de emoções. São as emoções que fazem movimentar o mundo. Já reparaste que hoje em dia só se ouve falar de crescimento: crescimento tecnológico, crescimento económico… Mas, ao ritmo atual, vamos crescer para onde? O excesso de tecnologia fez com que o homem se tornasse totalmente dependente de computadores, tablets e telefones. O Homem (com letra capital) tenta assintoticamente criar uma pretensa máquina da felicidade, pois acredita que só assim poderá se sentir realizado. E, mesmo agora, quando as pessoas estão recolhidas em casa, usa-se e abusa-se da tecnologia. Não que ela não seja necessária, mas… deveríamos gerir o excesso de tecnologia com parcimónia. No resto do tempo sugeria dedicarmo-nos a mais contacto com a Natureza, como a jardinagem ou construir uma pequena horta, criar animais, brincar com as crianças no exterior, apanhar sol, que também é outra forma de “comer” energia. Em relação a isto tenho uma história muito gira: quando comecei a dar os primeiros passos na nutrição integrativa assisti a muitos seminários. O que mais me surpreendeu foi o testemunho de uma mulher na Austrália que vivia há anos sem ingerir alimentos. Só água e luz do sol. A esta alimentação radical — que não recomendo minimamente — chama-se alimentação prânica (de Prana, energia vital, Qi). Eu não recomendo porque é muito radical e perigosa para as pessoas comuns, mas entendo o conceito: os animais têm algo de comum com as plantas, temos a mesma origem comum. As plantas realizam a fotossíntese, ou seja, só precisam da luz solar para criar energia e crescer. O ser humano tem essa capacidade só que de uma forma muito reduzida. Se pensarmos bem, é ao apanhar sol que são produzidas substâncias fundamentais ao nosso bom funcionamento, como a vitamina D, a partir do colesterol.

P: Então tu achas que existe uma relação entre as emoções, a alimentação, a imunidade e até a saúde mental, é verdade?

R: Está comprovado que existe uma conexão especial, um eixo cérebro-intestinos. Muitas pessoas referem-se inclusivamente aos intestinos como o segundo cérebro. E não é à toa, porque se juntássemos todos os gânglios nervosos que existem no intestino obteríamos o equivalente a um cérebro de um gato. As emoções e o movimento dos intestinos estão intimamente ligados. Vejamos: quando somos inflexíveis, não abdicamos nunca da nossa opinião, estamos presos aos nossos pensamentos, fazemos retenção, temos a obstipação; quando estamos com medo, ficamos com as fezes moles ou até diarreia, os nutrientes não são bem absorvidos, a saúde não está perfeita. Eu gosto sempre de dar o exemplo de um castelo: imaginemos que o nosso corpo é um castelo — tem as barreiras físicas que são as muralhas e depois tem os soldados que o defendem, que são as nossas células do sistema imunitário. Devemos pensar na barreira mais importante, onde há contacto entre o mundo exterior e o nosso interior. Essa barreira é a barreira da mucosa intestinal. Se comermos porcaria, ou, pelo menos, alimentos que pensamos que nos fazem bem, mas na verdade provocam alergia ou intolerância, como o leite e o glúten, a parede intestinal fica inflamada. Com a inflamação torna-se porosa. É o equivalente a o inimigo conseguir abrir buracos na muralha. Quando isso acontece, passa todo o tipo de lixo e microrganismos para a parte interior. É aí que atuam os nossos soldados. São chamados para lá todos os soldados para combater nas fissuras que foram feitas na muralha. Ora, isso implica que ao se deslocarem de outras muralhas para esta vão desproteger o resto do castelo, que fica mais vulnerável. Daí que quando existem “ites”, como a amigdalite, rinite ou a sinusite, devemos pensar em selar primeiro os nossos intestinos. A melhor forma é evitar os alérgenos conhecidos, que são os que a dieta do paleolítico preconiza, por exemplo. Devemos usar alimentos e suplementos que ajudem a desinflamar e a “selar”. Eu aconselho plantas calmantes como a cidreira, a aloé vera e a camomila, a curcuma, altamente anti-inflamatória, e a L-glutamina, que é um aminoácido que serve de combustível para as células de elevado turnover, ou seja, que sofrem regeneração com muita frequência, como é o caso das mucosas. Por isso também recomendo L-glutamina para ajudar a reparar o tecido pulmonar afetado pelo coronavírus, para quem sofreu desta doença na sua forma mais exuberante. Isto relativamente à parte da imunologia. Mas pensa nisto: se os intestinos estão inflamados, naquilo que se conhece como Low Grade Inflammation, ou inflamação de baixo grau, os nutrientes não vão ser absorvidos de uma forma assertiva e o que vai acontecer é que não se produzem serotonina e dopamina nas proporções ideais. Com o tempo surgem as depressões e os esgotamentos. A inflamação de baixo grau, por sua vez, faz com que haja em circulação vários mediadores da inflamação como as citocinas. Estas atravessam a Barreira Hematoencefálica, agravando a patologia mental. E assim entramos num círculo vicioso. Onde se quebra este círculo? Nos intestinos e por mudanças dos padrões mentais, ou seja, não podemos ter medo, preocupação, raiva, frustração ou inflexibilidade.

P: Todas as pessoas gostariam de saber o segredo da felicidade. O que recomendarias para andarmos, sei lá, nas nuvens? A um estado de total harmonia e paz interior… Achas que podemos chegar lá através da mudança de hábitos alimentares?

R: Bom, de caras digo-te que para andares bem emocionalmente e mentalmente tens de ter uma certa paz intestinal, como falei há pouco. Por isso, creio que para atingirmos o “Nirvana”, eh eh, devemos, ao invés de pensar o que comer, pensar em não comer, ou seja, fazer alguns períodos de jejum, como o jejum intermitente. É durante o jejum que o nosso corpo deixa de se concentrar na digestão dos alimentos e passa à fase de regeneração celular. Quando temos qualquer patologia devemos parar de comer. É isso que acontece instintivamente quando estamos maldispostos ou com gripe, por exemplo. Quando estamos com coronavírus, por exemplo, perde-se o apetite. É uma reação natural do organismo… Esse é o primeiro ponto. Quando queremos uma vida mais espiritual, vivendo o amor incondicional na força máxima, creio que será vantajoso, não só comer menos, como comer alimentos crus e sumos, com pouca ou nenhuma carne. De um modo geral as especiarias dão um bom aporte de antioxidantes e por isso recomendo usar amiúde na alimentação. O mesmo com os óleos de primeira pressão a frio, como o azeite e o óleo de linhaça. Os ómegas, sobretudo o ómega-3, são fundamentais para o funcionamento cerebral, para a retina e até para a produção espermática, em casos de infertilidade masculina. Podemos usar o óleo de linhaça, mas como a cascata enzimática até obtermos o DHA — que é o ácido gordo polinsaturado que mais importa para regenerar o cérebro e a retina —, é longa, sugiro a toma regular de óleo de fígado de bacalhau ou mesmo fazer suplementação com cápsulas gelatinosas de óleos de peixe de origem fidedigna. Alimentos contendo L-triptofano são muito importantes para a produção de serotonina. Um que tem muito triptofano é a carne do peru, por isso é que no dia de Ação de Graças, nos EUA, depois do jantar, fica-se com muito sono. Mas no reino vegetal sugiro comer sementes de sésamo, por exemplo em forma de Tahini, muito comum no médio oriente, e amêndoas, porque também têm uma boa relação cálcio / fósforo.

P: A dieta antioxidante incluindo os alimentos antioxidantes presentes nas especiarias são, portanto, responsáveis pela baixa incidência (e prevalência) de doenças do foro mental nos países orientais?

R: Além da filosofia de vida, mais desapegada e desprendida, sim, claro, a alimentação também tem o seu papel. As especiarias são importantíssimas para ajudar o corpo no combate ao stress oxidativo. Um dos exemplos é a curcuma, o açafrão-das-índias. Mas também os cominhos, a noz-moscada, os orégãos, o estragão, o rosmaninho. A lista é interminável. Gosto muito da comida chinesa, japonesa, mas sobretudo, indiana. Existe uma especiaria, muito usada na culinária indiana —o açafrão. Não o açafrão-das-índias que referi há pouco, mas o Safran, o Crocus sativus. É um estame de uma flor desta espécie que quando colocada na água tinge de vermelho. Tem propriedades marcadas como antidepressivo moderado. As dietas orientais, que depois tentámos importar têm muitas coisas interessantes. Aqui gostaria de referir um pormenor interessante: no Japão, que é o país com maior longevidade, e Okinawa ainda mais, em meados do século XX, houve uma escalada de incidência e prevalência do cancro, especialmente o cancro do colon. Isso deve-se à globalização. Tinham uma dieta altamente protetora e, mal decidiram importar as comidas ocidentais, como os derivados do leite, carne em demasia e processada, como hambúrgueres, o cancro disparou. Dá que pensar, não? Na índia, há mais pobreza, mais miséria, contudo as pessoas conseguem sempre mostrar um sorriso na cara. Isso quer dizer que, por um lado, as conquistas materiais não trazem felicidade coisíssima nenhuma e, por outro, que a alimentação contendo esta riqueza presente nos condimentos, como as especiarias, ajudam a manter uma saúde mental de ferro. Pensem nisso…

P: Eu sei que muitas pessoas que estão a assistir gostariam de te perguntar o que sugerias no caso de obstipação. E, já agora, também, a situação oposta: a diarreia, a Síndroma do colón irritável, as colites e até a doença de Crohn?

R: Ah, pois… não há receitas milagrosas pois, como te referi, depende muito do estado mental e emocional da pessoa. Também depende do estado de intoxicação… É normal conseguir melhorar muito a consistência das fezes só pelo recurso à desintoxicação hepática. Uma pessoa que está presa aos seus pensamentos, que remói e acha que tem sempre razão, acaba por demonstrar muita raiva contida. A raiva contida confunde-se sempre com um elevado nível de frustração — por exemplo o caso das mulheres que são oprimidas pelo marido — tipo buldózer emocional — de exprimir a sua opinião. Ah… porque isto de ter uma relação com alguém não é como ter um carro ou um telemóvel. As pessoas, as almas, não são propriedade… Seja como for, depois de anos de raiva contida, que depois se transforma em frustração, acaba por demonstrar os intestinos presos. Numa primeira fase, sugiro que se faça um ou dois meses de Cholagutt, para obrigar a vesícula a despejar a bílis. Se a pessoa tiver lito biliar — vulgo pedra na vesícula — temos de escolher outro detox hepático sem alcachofra, pois nesses casos a planta está contraindicada. A vesícula despejando o seu conteúdo no trato digestivo vai funcionar como um sabonete e obrigar o intestino a trabalhar mais rapidamente. Por vezes é o suficiente. Se não for, existe outra dica que eu uso e tem cerca de 100% de eficácia — a fibra do figo e da ameixa: Num copo com água colocamos dois figos secos e duas ameixas secas a demolhar. Meia hora antes de ir para a cama bebemos essa água e, se não houver contraindicações de maior, comemos os frutos demolhados, portanto, os figos e as ameixas. De noite, não se esqueçam… Em relação às síndromes de diarreia, quando temos a certeza que não se trata de uma toxicoinfeção alimentar podemos ajudar a corrigir a situação, considerando os pressupostos de uma dieta FODMAP, que é a mais indicada para as colites e Síndromes do colon irritável. O que ela tem de especial? Tem uma lista de alimentos, nomeadamente frutas e legumes, ricos em açúcares de cadeia curta, altamente fermentáveis, como a maçã, a cebola e o alho. Se durante uns tempos removermos estes alimentos, os intestinos não fermentarão com facilidade. Eu não queria muita esticar-me neste assunto porque muita gente sofre também de SIBO, que é Small Intestine Bacterial Overgrowth. Existe uma série de sinais e sintomas patognomónicos. Mas para isso, o ideal é sempre fazer a consulta com um naturopata.

P: E em termos de flora intestinal, tens algum conselho? Já se sabe que por detrás de terríveis doenças inflamatórias intestinais, mas também alérgicas, autoimunes e mentais, existe um quadro de disbiose intestinal. O que tens a dizer acerca disso?

R: Como eu já referi atrás quando falei da metáfora do castelo, é fundamental que a barreira intestinal esteja intacta e saudável para estarmos imunologicamente competentes. Uma das aulas que mais gosto de apresentar é a aula de probióticos. Sabemos que sobre a nossa mucosa intestinal existem milhões de milhões de bactérias. Há quem diga que chegam a ser dez vezes a quantidade de células que temos no nosso corpo. Mais acima no trato digestivo —estômago, duodeno, jejuno-ílion, intestino delgado bactérias mais ácidas, como os lactobacilos, mais abaixo, temos, na flora comensal, uma miríade de espécies. Umas vão crescendo mais do que as outras, como as enterobactérias, mediante erros da alimentação, toma de medicamentos e antibióticos e anestesias. Tudo isso altera a nossa flora simbiótica, que nos protege e nos favorece a absorção de determinados nutrientes fundamentais. Não era de todo descabido, para alguém que sofre de ansiedade ou até mesmo depressão pensar em tomar durante uns tempos uma dose reforçada de Lactobacillus rhamnosus e Bifiidobacterium longum, por exemplo. Existem inclusivamente formulações de cápsulas gastroresistentes com microencapsulação de milhões de milhões destas bactérias para melhorar o ânimo, pois melhoram a produção de serotonina e dopamina, entre outros mediadores químicos. Quando esta flora comensal está descompensada dizemos que estamos num quadro de disbiose intestinal. Temos a alternativa que acabei de referir, por recurso a cápsulas comerciais. No meu entender, podemos recorrer mais facilmente aos probióticos caseiros. O mais simples e conhecido de todos é o iogurte. Só que o iogurte só apenas duas estirpes: o Lactobacillus bulgaricus e o Streptococcus termophilus. A fermentação láctica destas duas bactérias faz com que o iogurte quase não tenha lactose do leite da vaca, pois é praticamente toda transformada no processo. Mas subsiste ainda a caseína, nomeadamente a β-caseína-A2. Por conseguinte, apresento sempre soluções como os pickles caseiros, o chucrute caseiro, a kombucha, o kefir, o miso, a umeboshi — estes dois últimos da dieta japonesa. Se consumirmos regularmente estes probióticos caseiros evitamos quadros de severa disbiose.

Yashaswita Bhoir on Unsplash

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